quarta-feira, 8 de setembro de 2010

O fim da terapia...

Quatro meses e vinte dias depois de ter sido implantado, pouco mais de três meses depois da activação do meu implante, é esta a minha avaliação!...
Os meus pais estão mesmo orgulhosos de mim....

terça-feira, 1 de junho de 2010

Ciao senhoras!...

Hoje é dia da criança, mas nem o meu pai nem a minha avó se lembraram... mas eu hoje estou a ter um belo dia. Acordei cedinho e chamei pelo meu pai (não, ainda não sei dizer pai, continuo a berrar!!... e ele vem!...) para me tirar da minha cama.
Aqui em Coimbra estamos assim como que... como dizer... acampados... foi muito difícil encontrar um apartamento, e depois de várias tentativas à procura de um apartamento para ficar 3 meses sem sucesso, tivemos de procurar um apartamento para alugar com um contrato normal... é muito perto do Hospital dos Covões, em São Martinho do Bispo, e tem uma varanda muito grande à volta da casa, na qual eu adoro brincar. Gosto principalmente de jogar à bola aí, e de abrir e fechar as portas da varanda, para ninguém poder sair nem entrar.
Eu é que mando!

Mas como estava a dizer, estamos aqui acampados, e eu durmo numa cama de viagem desmontável... não é muito confortável, por isso todas as manhãs vou um bocadinho para a cama com o papá ou a mamã, conforme está cá um ou o outro...

Depois tomei o pequeno almoço e fui para a Terapia da fala. Tenho muita sorte porque agora além da minha terapeuta (que é a única pessoa que me sabe pôr na ordem!...) nas últimas semanas tem estado outra senhora muito simpática. Não sei se será uma nova terapeuta, ou uma estagiária, mas o que interessa é "a máquina"!...
Esta máquina é o sonho de qualquer criança que se preze!... dá-se à manivela, et voilà, dezenas de bolas de sabão no ar!...
Adoro isto!...

...e depois são os apitos, os balões e não sei o que mais!... A verdade é que agora, que até já sei andar (fora alguns percalços), vou para a sala com o meu pai e entro sem sequer me despedir dele!... sim, é verdade, reconheço que não havia razões para aquelas choradeiras do início!... isto é uma diversão!...

A terapia neste momento passa muito pela imitação das coisas que me fazem... eu sei principalmente imitar gestos, e apesar de nos últimos tempos os meus pais não terem usado muito a linguagem gestual, eu desatei a fazer gestos para dizer tudo o que me apetece. Fico particularmente giro a dizer que quero ir passear, com os dois polegares encostados aos sovacos, como se fosse dançar o fandango, e os dedos a mexer como se fossem as pernas de uma centopeia.
Mas os apitos, as velas e as bolas de sabão são um instrumento para eu imitar o que fazem as bocas dos outros. Soprar, deitar a língua de fora, dar beijinhos, ... tudo vale!


Agora estou a dormir, mas a pensar nestes sons todos, que começo agora a fazer, como aquele "ao", de hoje de manhã, enquanto me despedia e fazia adeus com a mão!... Queria dizer "ciao senhoras, até amanhã"... ainda não foi perfeito, mas amanhã será melhor e depois ainda melhor...


Beijinhos
"ao"

Cocleantes

{ Mensagem atrasda de 15 de Março de 2010 }

Deixaram numa das mensagens deste blogue um comentário em que utilizavam o termo cocleantes, para aqueles que, como eu, usam um Implante Coclear... acho que o vou passar a utilizar.

Agora já conheço um bocadinho melhor as meninas que estão na minha sala. Uma é a Matilde. A Matilde tem um irmão mais velho que também é implantado, e tem agora 6 anos. O Gabriel passa os dias com a mãe enquanto esperam o fim da nossa aula. O meu pai esteve hoje a brincar com ele. O Gabriel gosta especialmente de carrinhos. Tem um saco cheio deles, e são todos espectaculares! Até tem um carrinho do Batman!!!
O Gabriel e a Matilde têm o síndrome de Waardenburg, que se pode facilmente reconhecer pelas manchas brancas de cabelo, e pelos olhos muito claros, ou de cores diferentes. Em alguns casos este síndrome causa surdez, que é o caso destes meus amigos cocleantes. O Gabriel já sabe falar, embora com dificuldade, mas pareceu-me que entende bem as coisas que lhe dizem. O meu pai pensa que ele não tem resultados melhores porque já foi implantado com três anos... será assim?
Uma das coisas que se diz em muitos sítios é que os implantes devem ser feitos o mais cedo possível, numa fase pré-lingual, ou seja, antes da fase em que os bébés aprendem normalmente a falar, e que é cerca dos 2 anos. Isto não é tão importante se com as próteses auditivas um bébé conseguir ouvir bem. No meu caso usei as próteses desde os cinco meses, mas não tive ganhos nenhuns.

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Quá, quá!... a, a!...

Já há muito tempo que não dava notícias!... tenho andado muito ocupado com a minha aprendizagem do mundo dos sons...

Hoje fiz a programação do meu implante. O meu pai ficou muito surpreendido quando a minha terapeuta lhe disse hoje que tinham conseguido programar todos os eléctrodos do meu implante! Não estávamos à espera e foi uma surpresa agradável.
Nas últimas semanas muitas coisas têm acontecido. Para mim, o mais importante foi começar a andar, principalmente porque estou sempre a tropeçar e de vez em quando dou umas cabeçadas! Ainda sou um bocadinho trôpego, mas já ando muito sozinho... por isso tenho de ter cuidado para não estar sempre a cair, o que requer muita concentração... mas não faz mal cair, porque quando caio e o chão ou a parede me acertam eu dou-lhes umas palmadas e eles põem-se logo no seu lugar!
Mas para os meus pais o mais importante é que eu cada vez reajo a mais sons. O meu favorito é o dos patos, que até já sei imitar!!: "a, a, a" - é como eu digo!...
Por vezes, só quando me apetece, claro, até já respondo pelo meu nome, e a outras palavras. Já sei o que é um "sapato" e quando me perguntam onde está eu aponto ou então faço o gesto correspondente - se não sabem como é podem ver aqui.
Gosto principalmente de música e de canções. Tenho um brinquedo que toca muitas músicas e adoro dançar quando começa a tocar. Também gosto quando os meus pais cantam para mim e até gosto que me cantem canções de embalar para adormecer... embora não goste muito quando me levam para dormir. Durmo bem, mas dou-lhes sempre luta!
Agora tenho de começar a falar, mas ainda estou um bocadinho preguiçoso... felizmente já identifico bem o a, e, i, o, u, mas só os digo quando me apetece, e ao calhas... tenho tempo para me tornar um tagarela.

Agora estou a dormir a sesta e a sonhar com os "ão-ão" e os "quá-quá" que espero poder ir ver a seguir ao jardim quando acordar.

Daqui a poucas semanas vou-me embora dos Covões e aí irei começar a ir para a escola, ter terapia da fala e brincar, brincar muito, pois é assim que vou aprender a conhecer os sons e usá-los para dizer o que quero... por agora sempre que quero alguma coisa grito!, o que deixa os papás com os cabelos em pé, o que até é divertido, mas que não contribui muito para a harmonia no mundo... é a única maneira de eu lhes dizer, mas eles não compreendem... prometo que quando souber dizer as coisas já não grito, mas por agora...

Até qualquer dia

Binas

quarta-feira, 14 de abril de 2010

O telemóvel

A tia X tem um telemóvel e quando ele toca, eu procuro-o, seguro-o e desligo-o!... bom, às vezes atendo, sem querer, porque ainda não reparei que quando o telemóvel tem a cabeça para baixo o botão vermelho está do outro lado!...

terça-feira, 13 de abril de 2010

Um mês depois...

Quá, quá, é como fazem os patos no Jardim, em Coimbra.
Mas eu não digo a ninguém que sinto estas coisas que são os sons... nem como os sinto e quando sinto.

Na semana de 22 de Abril fiquei com o Papá e a avó Setinha em Coimbra. Passeámos muito, vimos patos e ão-ãos pequeninos durante os passeios ao jardim, e fui todos os dias à terapia... estou farto!... eu até gosto da Marisa, que é a minha terapeuta e tem uma paciência de Job, mas não gosto de ver o Papá a ir-se embora da sala e continuo a reclamar quando ele sai. Agarro-me a ele e tento que ele fique, mas vai-se embora todos os dias. Mas passado um bocadinho já acabou a aula e ele está lá outra vez à minha espera. Na realidade à medida que os dias foram passando eu habituei-me a estar na sala, e cada dia participo mais e já faço aqueles jogos engraçados...

Já estava muito bem adaptado ao aparelho e nessa semana até me deram um programa novo, mais alto. Não gosto no início, quando se liga, mas já não me assusto tanto. Os meus pais têm sempre o cuidado de o colocar primeiro num nível baixinho e só depois o levantam.

Na semana seguinte estive com a mamã e com a tia X, que foi muito querida e veio fazer-nos companhia. Depois vim de novo com o Papá e a avó e esta semana estou com a Mamã, a avó Selinha e a tia X (uma festa, esta semana... tanto que tenho passado as noites acordado a moer o juízo da mamã).

Agora já não tenho dúvidas sobre este aparelho que me colocaram na cabeça. Acho que isto serve para alguma coisa: desde há 3 semanas é cada dia mais evidente que isto serve para perceber quando as pessoas à minha volta ficam doidas!
Já percebi várias coisas.
Quando há um noc-noc-noc, é porque alguém está zangado com a porta, a bater-lhe. Às vezes olho para todos os lados, à procura, e não vejo ninguém, mas passado um bocadinho lá aparece o papá, ou a mamã, a bater com o punho na porta. Mas não parecem zangados, até fazem umas caras de felicidade extrema, como se ficassem satisfeitos depois de bater numa porta... não percebo muito bem.
Também já percebi que os meus animaizinhos de brincar costumam fazer uns barulhinhos... muuuu, mééé, miaaau. Mas não faço ideia quem faz o quê, e muitas vezes reparei que a Marisa ou os meus pais estão a fazer uns gestos com a boca quando oiço os animais,,,
...e depois há os guizos, sinos, palmas,,, há mesmo muita coisa que começa agora a revelar-se... o que eu gosto mais é de dançar... o papá e a mamã às vezes ligam a aparelhagem e colocam um CD no play... e dançam e eu adoro dançar com eles!,,, ninguém abana a cabeça tão bem como eu!... por agora limito-me a imitar os papás, mas acho que aquilo de pôr o CD me dá mais vontade... acho que faz mais uns sons, daqueles que o aparelho me passa, e que por acaso até são agradáveis...

Também me apercebi que quando eu faço estas coisas todas com os sons os meus pais ficam todos lamechas... a lamechisse maior é quando me vão adormecer... fazem outra coisa nova para mim, que é cantar cantigas de embalar... gosto principalmente quando eles me apertam contra o peito enquanto cantam... sinto assim uma vibraçãozinha agradável, que me embala... e mais uma vez alguns sons, a acompanhar... o pior é a letra da canção de embalar... só se lembraram de um música de embalar brasileira que se chama "boi da cara preta"...      :-P    mas a verdade é que como fico sossegadinho eles acham que eu estou a gostar e ficam todos contentes.

Quanto a fazer a programação do meu aparelho... desculpem, mas é demais por agora... não consigo evitar e continuo a recusar-me a fazer aqueles jogos muito organizados... como diz a mãe de um dos meus colegas de sala, vou acabar por ser político... aplaudo o trabalho dos outros, quando me mandam trabalhar passo a vez e agora tenho uma nova mania... além de dizer adeus a toda a gente na rua, como se fosse a Raínha de Inglaterra, também distribuo bacalhauzadas à Paulo Portas em mês de eleições... quando resolver colaborar conto-vos, mas não sei se estará para breve... vou pensar no assunto.

quarta-feira, 24 de março de 2010

Nove e meia, onze, onze e meia, meio-dia e meia...

Nove e meia, onze, onze e meia, meio-dia e meia... são assim os meus dias em Coimbra. Na semana depois da activação os meus pais conseguiram estar os dois comigo em Coimbra. Um tirou uns dias de férias, o outro pôs baixa para assistência à família, ou seja, a mim!... e que  bela assistência que eles me deram...

No fim-de-semana voltámos a Lisboa. Foi um fim-de-semana muito bom, principalmente porque me vieram visitar a ti'Tunning e o tio Tó Zé Barbas. Brincaram comigo o dia todo até à noite. Ao final da tarde o pai foi buscar a Avó Setinha e jantámos todos juntos.
Depois de jantar fomos todos embora, cada um para seu lado, e eu fui com o papá e a mamã para Coimbra... acho eu, que foi assim, porque no outro dia de manhã, quando acordei, já lá estava.

Durante o fim-de-semana não me importei nada com o aparelho, e o meu pai até o passou para o programa três... faz um bocadinho de cócegas, mas não custa nada.

Agora, todas as segundas-feiras, às nove e meia, vou para o trabalho. É assim que lhe chama a minha terapeuta da fala. Eu não gosto! Bom, na realidade, até não me importo. Fico sentado numa cadeira, à volta de uma mesa cheia de brinquedos junto com as minhas colegas Vanessa e Matilde. Daquilo que não gosto é de ver o meu pai e a minha mãe pelas costas... e farto-me de gritar! Sou assim quando não estou de acordo com alguma coisa. Felizmente passa-me depressa, e fico logo bem disposto. Normalmente começo a brincar com a Matilde e esqueço-me....

Nos Covões há uma sala de espera para os meninos. Quando chegamos de manhã ficamos lá todos na brincadeira. Eu sou o único que ainda não anda sózinho. Por isso gosto muito da brincadeira das cadeiras. Cada um de nós empurra uma cadeira pela sala, daquelas pequeninas, e andamos à volta das mesas a fazer uma barulheira. Depois há sempre alguém que volta a arrumar as cadeiras. A Vanessa gosta de alinhar as cadeiras todas... depois anda em pé por cima delas e salta para as cadeiras dos adultos!
Além deste jogo gosto muito de passear pelas salas de espera, pelos elevadores e principalmente gosto de ficar em pé junto às portas de vidro que dão para a rua.

Ficamos na sala até às onze e meia. Fazemos jogos, brincamos e trabalhamos. O trabalho é muito simples. Agarramos num brinquedo, esperamos que nos digam, por exemplo com o sopro do peixe de borracha, e nós colocamos esse brinquedo numa caixa. O objectivo deste jogo é eu aprender a responder primeiro a este estímulo, para mais tarde passar a responder aos sons. Quando eu souber fazer isto vão poder programar o meu implante de forma a eu poder ouvir o melhor possível. Esta é a razão pela qual vim para Coimbra.
Eu sei que este jogo é muito importante, mas detesto que me segurem as mãos.
No final desta segunda semana já andava com o programa quatro ligado, mas cada vez que ia para a sala choro. Não gosto de estar longe da mamã e do papá, e detesto estar ali preso... a única coisa que me diverte é agarrar nas coisas todas que estão em cima da mesa e atirá-las para o chão... é a única oportunidade que tenho de sair da cadeira e de ir para o chão.
Os meus pais estão com um ar preocupado, e isso não me facilita a vida... quando vou para a sala choro ainda mais e eles ficam ainda com um ar mais preocupado.

Também gosto das onze horas. A essa hora saio de novo da minha sala. Às vezes o meu pai vem-me buscar e eu estou a chorar, porque alguém não me fez a vontade, e outras vezes estou bem disposto a brincar. Até às onze e meia ficamos na sala infantil, de novo todos juntos, a arrastar cadeiras, a comer e a trocar os pneus nas boxes (fraldas no fraldário)... no primeiro dia os meus pais distrairam-se e trocaram-me os pneus na sala de brincar. Que porcaria!...

Das onze e meia até ao meio-dia e meia voltamos aos trabalhos, forçados, e eu continuo, coerente, com a minha atitude... chorona, podemos chamar-lhe.
Esta semana deu cabo dos meus pais, não viram os resultados que na cabeça deles queriam ver, e eu andava assim um bocadinho chorão. Mas a semana acabou melhor, e eu passei a chorar só dez minutos de cada vez que ia para a sala e já não me importava de andar com o programa mais alto.

Só não gosto que me ponham de repente o aparelho na cabeça quando já está ligado... faz-me impressão e eu até estremeço, como se estivesse a levar um choque! Mas não faz mal, é mesmo assim, eu é que não estou habituado. Agora os meus pais começam por me colocar o aparelho desligado na cabeça, e só depois o ligam, e num programa muito baixinho, para eu não me assustar.

Foi assim, a primeira semana depois da activação do implante. Estávamos todos muito cansados e eu fui a dormir no carro o caminho todo até Lisboa. Mas o objectivo desta semana estava cumprido. Já não me incomoda ter o implante na cabeça, já aceito o programa mais alto e lá vou aguentando o tempo que estou na sala.
É isto que se pretende na primeira semana. Não me transformei dum dia para o outro, mas dei um primeiro passo no caminho dos sons. E no fim desta semana, os meus pais até querem acreditar numa série de coisas que "vêem"... eu agora estou sempre a cantarolar, "hmmm, hmm, hmmmmm, hmmm" e às vezes pareço reagir a alguns sons mais altos... eu não sei o que são sons, por isso não os percebo muito bem. Vou esforçar-me para os tentar perceber, mas por favor dêem-me tempo, que esta história dos "sons" é muito confusa, e os bébés demoram normalmente seis ou mais meses até os começarem a entender, um bocadinho... eu já sou um rapaz crescido, mas dêem-me mais uma semana ou duas...

Até logo, já vos conto como foi a segunda semana, em que o meu pai veio com a Avó Setinha e comigo para Coimbra, sobre os patos do jardim, e muito mais...

quinta-feira, 11 de março de 2010

Activação rima com desilusão, ou com trabalho?

Quase tudo o que podiam fazer por mim, já fizeram. Agora, sou eu quem vai decidir o que fazer com este implante que me ofereceram.

Hoje, embora esta semana tenha tido uns dias fantásticos em que os meus pais estiveram quase sempre comigo, sinto-me um bocadinho desiludido com eles. Será que ainda não perceberam que ontem foi apenas o primeiro dia do resto da minha vida?

Ainda assim vou desculpá-los. Talvez tenham visto demasiadas vezes o que desejavam ver, como por exemplo em casos como nestes filmes que abundam no youtube:
A minha activação foi uma desilusão para os meus pais. E a culpa foi toda deles! Até tinham levado a câmara de vídeo para filmar... não filmaram grande coisa! A activação não é "ligar o chip" e começar a ouvir. É o primeiro passo numa caminhada que vai ser longa e com muitas quedas até aprender a andar.

Mas para mim não foi desilusão nenhuma. Até gostei, mas ainda não me habituei completamente àquilo. E "aquilo", a parte de fora do implante coclear, é ligeiramente mais complicado do que as próteses auditivas que eu costumava usar. Mostro-vos a seguir uma imagem que podem encontrar na wikipedia, para verem como é, e prometo que um dia vos mostro o meu.
O meu implante é de uma empresa australiana chamada Cochlear, mas há várias outras empresas a fazer implantes, como a Advanced Bionics. Penso que nos Covões fazem bem em relação à escolha da marca. É necessário formar muitas pessoas para saber usar bem um determinado aparelho e, principalmente nas crianças, o feedback é muito lento. Assim, como são obrigados pelas regras dos concursos públicos a admitir vários fabricantes e fornecedores, usam os implantes de outras marcas nos adultos, para aprenderem, e só considerarão usá-lo em meninos pequeninos quando o conhecerem bem. Na Estefânia disseram-nos que o implante a colocar iria depender do resultado do concurso público. Ouvi dizer que há um movimento de implantados e pais de implantados no sentido de poderem ser os pacientes a escolher o seu implante.

Bom, mas o que eu vos queria mesmo explicar é que, junto com o meu implante, veio um grande koala, muito peludo, e que usa um implante igual ao meu.
O implante é simples assim: um microfone pendurado atrás da orelha, e uma antena na cabeça (como na fotografia da menina de rabo de cavalo). Ah!, actualmente os aparelhos vêm com um comando à  distância (o meu pai teve de fazer aquela piadinha fácil "o Manuel agora tem um comando" e o Dr. Jorge não se ficou atrás "mas atenção que não dá para o desligar"... são uns engraçadinhos!...)


Na peça em que está o microfone está o processador de som e liga-se também a bateria. A antena emissora exterior (aquela rodela que parece presa ao cabelo da menina) é presa à cabeça através de um íman que se prende ao íman que está na antena receptora implantada na cabeça. É essa antena que leva os sinais eléctricos transmitidos por indução magnética até à parte interna do ouvido, mais propriamente à cóclea, onde é estimulado o nervo auditivo (podem ver uma explicação interactiva no site da Cochlear).
No meu caso era aí que estava a causa da minha surdez. No meu e em muitos outros casos, há umas células, as células ciliares, ou ciliadas (hair-cells em inglês) que não funcionam como deviam e, por isso, a cóclea não consegue exercer a sua função de transformação do som em sinais eléctricos que o nervo auditivo faz chegar ao cérebro.
Não me perguntem como é que eu sei estas coisas todas... mas como ninguém me explicava nada tive de recorrer à internet para me informar e tentar perceber o que se passava com os meus ouvidos. Fácil, até um bébé sabe fazer!...

Bom, agora começa a parte que eu não gosto muito de contar. Ontem passei o dia a arrancar tudo da cabeça e atirar para o chão!... sim, é verdade... os meus pais passaram o dia a tentar pôr-me o aparelho e às vezes aquilo dava-me uma sensação esquisita na cabeça... já sei, voltei a portar-me assim-assim... pronto!, portei-me mesmo um bocadinho mal, mas também temos que admitir que me provocaram... o papá e a mamã são muito desajeitados, não percebem nada de como funciona o implante, e têm de me agarrar para conseguir pôr tudo no sítio certo... não há paciência!... depois de jantar eles já estavam com um ar tão cansado, que eu resolvi fazer um esforço e dar-lhes uma trégua. Eles também acabaram por perceber que não é à força que nos entendemos melhor e começaram a usar em mim toda a psicologia infantil de que se lembraram... foi vê-los a dançar, girar, fazer todo o tipo de macacadas, colocar neles próprios o aparelho... um pagode, como eles costumam dizer...  No fim do dia os papás decidiram que iam usar um dos acessórios que vêm com o implante para prender os aparelhos à minha roupa. Vamos ver se não atiro tantas vezes por dia uma dezena de milhar de euros ao chão!...

Hoje já foi tudo muito mais calmo... não sei se terá sido das emoções de ontem, ou por ter passado uma hora  acordado durante a noite a dar umas bofetadas amigáveis na mamã, mas hoje de manhã fiz uma coisa inédita!... dormi até às 9 da manhã e só me levantei quando me acordaram... e logo no primeiro dia de terapia nos Covões. Quase que chegava atrasado.
A minha terapeuta chama-se Marisa e é muito simpática. Na minha sala estão mais três meninos. O Joaquim fez hoje o seu último dia de terapia. É um menino cigano um bocadinho mais velho, penso que terá cerca de 5 anos. Já sabe responder pelo nome, parece que tem feito muitos progressos. Alguém comentou que o pai dele, que é quem o acompanha em Coimbra, disse um dia: "nenhum dos meus filhos há de ser surdo" e foi com ele para Coimbra. Boa sorte Joaquim, pode ser que nos encontremos por aí um dia.
Há também duas meninas, a Vanessa e a Matilde. Uma está já no início do terceiro mês de terapia, e a outra, depois de já ter estado 3 meses em terapia, teve de vir fazer mais um mês para que tentem tirar melhores conclusões sobre os seus progressos. Não tarda nada volta para Oliveira de Azemeis. A outra menina tem um irmão que também foi implantado. Têm os dois uma mancha branca no cabelo, o que penso que revela uma surdez de origem genética associada a uma situação de que nos falou o geneticista na consulta que fizemos na Estefânia. No meu caso ainda não sei porque sou surdo, mas isso não é muito importante...

A terapia passa-se todos os dias das 9:30 às 12:30, com um intervalo para descansar e para estar com os papás. Eu também aproveito o intervalo para comer qualquer coisinha, saibam que não desperdiço uma oportunidade, e para mudar a fraldinha.
No início o fundamental é tentar esquecer-me que tenho o aparelho na cabeça. Tenho tentado mas, dizem que é do meu mau feitio, sempre que me chateiam, lá vai o meu braço arrancar tudo do sítio. É um reflexo!... Nesta fase há uma série de intensidades do aparelho (que por lá chamam normalmente programas) pelas quais irei passando progressivamente, para me ir habituando. Quando conseguir usar o 4º programa, já estarei a usar a máxima intensidade. Nas próximas semanas, se usar o aparelho mesmo sem estar ligado já será entendido como bom.
Na sala de terapia, o programa é bastante simples. Estamos à volta de uma mesa, sentados numas cadeirinhas muito confortáveis, e fazem-nos o que fizeram aos cães do Pavlov: condicionam-nos. Ou seja, ensinam-nos um jogo em que vamos reconhecer os sons. Quando reconhecemos os sons pomos um brinquedo numa caixinha. Com este trabalho, conseguimos transmitir uma informação fundamental para as terapeutas poderem ir dando informação que permita adaptar o nosso implante às nossas capacidades de compreensão dos sons.

Agora estou a dormir, a minha mãe também e o meu pai devia ir. Amanhã vamos continuar esta aventura. Talvez amanhã já não me importe com o 2º programa. Hoje quando tentaram ligá-lo eu não achei muita piada e fartei-me de chorar, porque eles não percebem outro tipo de linguagem. À noite já estive com o programa 2 um bocadinho ligado, mas só porque o fizeram à socapa. Mas o aparelho voltou a fazer aquelas cócegas esquisitas na cabeça e eu lá tive de os chamar de novo à razão... à minha maneira. Amanhã é outro dia.

Punkenstein

Já tirei aqueles pontos todos da cabeça. Já não tenho capacete. Toda a gente me mima a dobrar. Já posso ir à rua!!! Yuupiiii!

A vida está a correr-me bem, mas quase que corria mal... não por mim, que me portei muito bem enquanto me tiraram os pontos, mas o meu pai ia-se ficando!...
Passadas menos de duas semanas desde a operação, lá fui eu de novo para Coimbra para tirar os mil-e-um pontos que me deram na cabeça. Tivemos muita sorte porque apesar de termos chegado muito atrasados, fomos logo atendidos.
Este ano o São Pedro tem andado muito virado para as regas. Chuvas torrenciais, trovoadas, inundações por todo o lado, o temporal e a tragédia na Madeira... no dia em que fui para Coimbra também apanhámos uma chuvada terrível. Quase que não se  via nada pelo vidro do carro, e demorámos quase o dobro do tempo a chegar. No meio disto tudo só gostei de uma coisa: os limpa para-brisas... acalmam-me!...
Quando finalmente chegámos, cerca das 10:00, com uma hora de atraso, tivemos muita sorte. Fomos avisar que tínhamos chegado e, como as senhoras enfermeiras me viram ali à porta, chamaram-me logo para ser o primeiro... nem tive tempo para me aperceber do que aí vinha. As coisas começavam a parecer-me mal encaminhadas.
Começaram por perguntar qualquer coisa aos meus pais, que eu não percebi, mas a minha mãe saiu da sala, e o meu pai agarrou-me no colo, todo enroladinho num lençol e fez uma das coisas que eu mais detesto: prendeu-me as pernas! Eu comecei a reclamar, veementemente, mas uma senhora ajudou o meu pai a agarrar-me e prendeu-me a cabeça. Agora que olho para trás, não foi muito difícil, mas durante aqueles minutos, esperneei tanto quanto me deixaram. Felizmente eles tinham força, e a Enfermeira que me tirou os pontos conseguiu tirá-los quase todos depressa e sem me espetar a tesoura na testa!
No fim é que ia acontecendo um desastre. Quando se tiram os pontos, e principalmente quando alguém como eu manifesta o seu desagrado fazendo muita força, é normal haver umas gotinhas de sangue. O meu pai tem um certo historial com sangue, parece que não é muito amigo de o ver. Por exemplo, no ano passado, feito corajoso, foi dar sangue para o Instituto Português do Sangue. Como resultado passou duas horas com os pés a apontar para o tecto para ver se não desmaiava, e um dia inteiro mal disposto. Ora o meu pai, de repente, quando viu um bocadinho de sangue que caiu quando me tiraram os pontos dentro da orelha, começou a empalidecer como se tivesse visto um fantasma. Felizmente aquilo tudo já tinha acabado e a minha mãe, que se tinha afastado um bocadinho porque não compactua com pessoas que me querem magoar, já tinha voltado e pegou em mim, enquanto o meu pai voltou a pôr as pernas para cima até lhe voltar o sangue ao toutiço!...

E pronto, voltámos logo a seguir para casa e eu pude ir mostrar à Vivi o meu penteado novo, com um look radical: cabelo rapado só de um lado, grande no resto da cabeça!... sou assim uma espécie de mistura entre o Frankenstein e um Punk. Vamos a ver como resulta com as miúdas!...

segunda-feira, 8 de março de 2010

A doce prisão domiciliária

Ahhhhh!, é óptimo poder gatinhar à vontade no meu corredor... pôr-me em pé ou sentar-me quando quero, mexer em tudo o que me apetece... mas acho que se passa alguma coisa com os meus pais. Agora andam sempre atrás de mim, levam-me para todo o lado e não se afastam nem um bocadinho.

A verdade, segundo percebi, é que os meus pais têm medo que eu dê uma cabeçada em algum lado. Este capacete é fofinho, mas parece que não é à prova de tudo... e é preciso ter cuidado pois o meu implante foi colocado há muito pouco tempo, e precisa de tempo para se acomodar, fixar e para que o golpe que me fizeram cicatrize bem. Segundo o que os meus pais no outro dia pareciam estar a dizer, são mais de vinte pontos na minha cabecita que, apesar de eu sair ao papá no que respeita a perímetro cefálico, ainda é muito pequenina...

Felizmente, a avó Setinha primeiro, e depois a avó Selinha, vieram passar uns dias comigo e ajudaram a minha amiga Vivi e os papás a tomar conta de mim... assim que cheguei a casa voltei a dormir bem, a recuperar e ainda aumentar o meu apetite, e a estar sempre bem disposto. Sempre? Quase sempre!
Os meus pais meteram na cabeça que, uma vez que estava a tomar o antibiótico, não me deviam levar à rua... SEEEECA! Eu adoro ir à rua, e esta espécie de prisão domiciliária estava a deixar-me os nervos em franja... felizmente a semana passou depressa e eu estava pronto para voltar a Coimbra, tirar os pontos e parar de tomar aquela mistela branca que me davam junto com o leite, com os meus iogurtes, numa seringa... arghhh!... não sou grande apreciador de remédios!...

O Carnaval

Os dias do fim-de-semana no hospital passaram a velocidades diferentes. Já tinha recebido muitas visitas antes, e no Sábado voltei a ter mais companhia que, aqui entre nós, confesso, é a coisa de que eu mais gosto! 
A avó Setinha veio visitar-me no dia da operação e fez companhia aos meus pais durante aquelas horas de espera que pareciam nunca mais acabar. O tio Manel trouxe a avó, que precisa sempre de chauffeur, porque não conduz desde uma longínqua tarde de verão... o papá aproveitou que o tio estava cá e voltou a cravar-lhe uns cigarros, que sempre ajudam a passar o tempo e a soltar a conversa...
No dia seguinte veio visitar-me a madrinha, que passou o dia a brincar comigo e com um quadro magnético do Ruca que eu adorei. Os meus pais aproveitaram esse dia e foram ver um apartamento para ficar durante os meses da minha recuperação... era ao pé do Portugal dos Pequenitos, o que para mim parecia ser interessante, e tinha uma vista linda sobre Coimbra...
No dia seguinte veio visitar-me uma amiga da mamã e o meu pai foi ver mais casas para alugar e, depois de ter visto algumas casas onde poderíamos morrer de frio num dia de verão, em desespero de causa, foi de carro à procura de casas na zona do Hospital dos Covões.
No Sábado trouxeram-me um nariz de Palhaço que usámos à vez... na palhaçada!...
Passou de facto muito depressa. O tio Barbas, a tia das picas, a tia X, o meu primo mais velho, a vóvó Selinha... vieram todos visitar-me!... parecia um daqueles fins-de-semana na Covilhã. Passaram todo o dia comigo, o que foi uma sorte! Pusemos todos o nariz de palhaço, que ficava especialmente bem ao primo Henrique, e tirámos fotos para mais tarde gozar. Foi também neste dia que me trouxeram daquela sopa da avó de que eu gosto tanto. E eu comi como já não comia há uma semana! Não porque a comida do Hospital fosse especialmente má, ou porque eu tivesse muito pouca fome, mas a verdade é que me custava um bocadinho a mastigar, por causa da costura, e isso não ajudava muito... eu até gostava da hora da comida no Hospital porque havia sempre alguém que me vinha visitar. Lembro-me principalmente da Dona Alice, que me fazia umas caretas muito engraçadas, e que me ensinou a fazer OK ao contrário, com o polegar virado para baixo...

O Domingo foi o contrário do Sábado. A Dra. Margarida tinha dito aos papás que, uma vez que nos feriados não há altas, a minha ida para casa ia ser antecipada para a véspera do Carnaval. A vontade de voltar a casa, e o facto do Domingo ter sido o único dia em que não tive visitas tiveram um efeito de dilatação do tempo que não sei se o próprio Einstein saberia explicar... talvez o seu motorista soubesse... a verdade é que só com muito custo, e com muita reposição dos adesivos os meus pais conseguiram manter-me o capacete na cabeça... só à custa das suas espondiloses, escolioses e lordoses me conseguiram segurar enquanto eu calcorreei todos os corredores dos Covões... e só à custa de muita paciência conseguiram fazer-me dormir, comer, vestir-me e dar-me aquele antibiótico que sabia a peixe com açúcar... admito que não me portei especialmente bem mas, se pensarem que estava fechado dentro dum hospital, há uma semana, sem poder gatinhar, e sem poder brincar à vontade, até se pode dizer que não fui muito exigente!

Na segunda-feira a Dra. Margarida cumpriu o prometido (eu também tinha cumprido a minha parte) e mandou-me embora, para casa! Fizeram-me um capacete novo, limpinho, e lá fui eu de volta a casa para passar o Carnaval em Lisboa. Decidi mascarar-me de múmia,,, o disfarce já estava meio preparado!...

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Sou surdo?...como posso saber?...

Cá estou eu de novo, a mamã a dormir ao meu lado e o pai de volta à residência...
Hoje foi apenas mais um dia... fartei-me de brincar, mas continuam a não me deixar ir para o chão!... ainda me aguentei sem arrancar o capacete, mas se amanhã continuam a não me deixar ir para o chão, e se voltam a acordar-me a meio da sesta, arranco-o de uma só vez!...
Tive de voltar a fazer um RX, e por causa disso interromperam-me a sesta, mas a grande notícia do dia é que acabei de levar a última pica!... a partir de amanhã tomo o antibiótico em xarope, o que por por pior que saiba, não pode ser tão mau quanto levar duas picas na perna ou no rabo por dia!...

Já vos tinha contado como foi detectada a minha surdez, mas ainda não vos contei como foi a minha vida até vir aqui ser operado a Coimbra... vou tentar...

Quando fizeram o rastreio, com um resultado negativo, os meus pais sairam a correr para tentar ir ao otorrinolaringologista que o Dr. Birne indicou. O Dr. E. recebeu-nos naquela mesma sexta-feira, fez-me alguns exames e disse aos meus pais uma coisa que os deixou imensamente felizes: - o Manuel tem um ouvido compatível com a audição! No entanto têm de ir fazer um exame chamado ERA, ou potenciais evocados, para confirmar que está tudo bem... (podem ver um site interessante sobre este exame em http://corticalera.com/index.htm).
Ora isto foi uma espécie de mentira piedosa, mas que aliviou as semanas seguintes dos meus pais... parecia que aquele elefante tinha ganho assas e saído de cima deles... ENGANAVAM-SE! Não sei se as palavras do Dr. E. foram propositadas, ou não, mas a verdade é que induziram um alívio falso, e que me parece perigoso, pois poderia ter levado os meus pais a descurarem o exame seguinte... de acordo com tudo o que depois disso os meus pais vieram a ouvir e a ler, apenas os exames de potenciais evocados podem determinar numa criança, que ainda não comunica com os outros, se existe audição....

Para percebermos isto é necessário saber um pouco como é o desenvolvimento da audição no ser humano. Nos primeiros meses, praticamente não ouvimos nada... na realidade, o único teste que pode indicar se ouvimos qualquer coisa é verificar se nos assustamos com barulhos muito fortes... no entanto, este exame é muito, muito difícil!... várias vezes os meus pais pensaram que eu me tinha assustado com barulhos, e ficaram contentes, mas entre coincidências, transmissão das vibrações através do soalho e outras causa, estavam enganados. Andavam sempre a tentar assustar-me, ansiosos, e sem ter quaisquer certezas.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Já está!...

Já está!... e na realidade, não custou nada!... ou quase nada...



Como podem ver, o meu capacete fica-me muito bem! Ontem e hoje decidi que ia dar um presente aos meus pais: ainda não o arranquei da cabeça, nem uma vez!
Amanhã logo se verá...

Quando as Sras. de azul me levaram a passear, comecei a perceber que havia ali gato... no entanto, não me chateei muito. Havia por ali muitas luzes, e coisas novas que me interessavam... mas quando de repente olhei para trás e não estavam lá nem o papá nem a mamã, não gostei muito da brincadeira... resmunguei um bocadinho mas meteream-me uma daquelas coisas para respirar na boca e no nariz, tipo piloto top gun, e eu adormeci...

Durante quase 3 horas, o Dr. Quadros, a Dra. Margarida, a enfermeira Branca e toda uma equipa com muita experiência trataram de mim e colocaram e testaram com sucesso o implante coclear que me há de acompanhar ao longo da vida (se eu não der nenhuma cabeçada com demasiada força em algum lado...).

Aproveito para vos dizer que a National Geographic nº 107, de Fevereiro de 2010 - edição portuguesa - tem um artigo sobre os implantes cocleares nos Covões... nada de profundo, mas ainda assim interessante pela sua capacidade de divulgação.

Quando acordei, estava tudo um pouco confuso, mas estava ali a mamã, o que me acalmou um bocadinho... mas não gostei muito desse momento... estava zonzo, com fome e sono, e com umas coisas nas mãos, na cabeça... arggghhh!... a vida não me parecia estar a correr muito bem!... mas na realidade até estava... comecei a descontrair e às cinco da tarde já estava com os meus pais no quarto... e nem estava especialmente mal disposto... claro que pelo caminho houve umas peripécias, como por exemplo ter arrancado o cateter por onde supostamente me iriam dar os antibióticos e ter espirrado sangue por todo o lado... o meu pai parecia, como acontece quando não me apetece comer mais e faço brrrr e cuspo a sopa, um pintor de carros todos salpicado... agora tenho o castigo respectivo... de 12 em 12 horas levo uma pica!... bom, dói um bocado, mas por outro lado tenho as duas mãos completamente livres para brincar com o quadro magnético do Ruca que os meus pais me deram.

O Hospital dos Covões não é um Hospital pediátrico. E o que quer dizer isto? Quer dizer que não há camas de grades para os bébés, nem camas para os acompanhantes... com isto, na primeira noite, porque a enfermaria estava cheia, a minha mamã teve de dormir agarrada a mim, numa cama individual pequenina... eu até gostei, mas parece que isso, mais o facto de terem entrado pelo quarto não sei quantas vezes durante a noite e terem acendido as luzes, não deixou a minha mãe dormir muito bem. Felizmente ontem e hoje ficou uma cama livre e ela pôde dormir numa cama encostada à minha. Mas aquilo que é mesmo mau é não haver nenhum sítio onde eu possa gatinhar à vontade... que seca!...

A única vantagem deste Hospital não ser de crianças é que isso faz de mim uma espécie de vedeta, e toda a gente me mima!... gosto especialmente da Dona Alice, que é uma pessoa muito importante neste Hospital!... é ela quem traz a comida!... e tem o cuidado de me servir em primeiro lugar, está sempre a oferecer-me sobremesas extra e faz-me umas caras muito giras que me fazem rir.

No dia da operação passei muito tempo a dormir, mas por volta das sete horas da tarde estava acordado e cheio de fome... comi duas doses de papa Cerelac, e se me tivessem dado mais!... depois fui dormir outra vez. Dormi a noite toda, mas de vez em quando sentia um certo incómodo e resmungava... mas quando acordava, lá estava a mamã a agarrar-me a mão, e eu adormecia de novo...

O dia a seguir à cirurgia já foi muito melhor... fiz as minhas refeições todas como de costume, tive apetite (embora não goste muito da comida que aqui me dão) e muita vontade de brincar!... o meu capacete tinha algum sangue, que disseram aos meus pais ser normal, e a Dra. Margarida quando me veio ver disse para mudarem... fiquei com aquele capacete novo que viram na fotografia, e aproveitei para mostrar a minha cicatriz aos meus pais... eles portaram-se bem, não desmaiaram, nem fizeram outro tipo de dramas, o que me deixou aliviado... é uma cicatriz jeitosa! Não os contei, mas são mais de vinte pontos, muito certinhos, que vão desde a parte da frente da orelha, até meio da minha cabeça, que agora está rapada desse lado... até nem me fica mal!
O meu pai decidiu que me vai tirar uma foto, e depois vai fazer um quadro junto com uma fotografia dele também com a cabeça nesse estado, depois de a ter partido com uma joelhada na sua própria cabeça!... ai, ai, que pai desajeitado que eu tenho!...

Entretanto este dia já foi divertido. Além do brinquedo do Ruca passei o tempo a fazer desenhos, a passear de um lado para o outro (eu ainda não ando sozinho, mas os meus pais e a madrinha ajudaram-me), fiz algum montanhismo (a subir pelas costas das cadeiras, os colos de quem podia e da cama para cima da mesa de jantar móvel...) e deram-me muito colinho, que eu gosto muito! Acho que a mamã ficou cmo uma vértebra deslocada de passar tanto tempo comigo ao colo. DESCULPA MAMÃ!... quando fores velhinha ando eu contigo ao colo! Também veio cá a madrinha, que ficou a brincar comigo enquanto os pais foram à procura de uma casa para ficar o período da recuperação em Coimbra.

Agora vou voltar ao meus sonhos. A mamã está aqui a dormir ao meu lado e o pai voltou para a residência da Obra de Sta. Zita em que tem ficado.
Quando puder conto-vos mais. Boa noite!

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Estou agora a ser implantado

Bom dia!
Neste momento estou a ser operado para me colocarem um implante coclear.Hoje acordei muito bem disposto e contente pois a minha mãe dormiu toda a noite comigo, na cama, e quando acordei o meu pai já lá estava ao pé de mim. Depois fomos todos para a zona do bloco operatório onde fiquei à espera de ser operado. Os meus pais puderam ficar comigo o tempo todo, e aquelas senhoras todas vestidas de azul foram muito simpáticas!... deram-me um balão feito com uma luva, uma caneta para o meu pai lhe desenhar uns olhos e um :D , e eu fartei-me de brincar... Agora estou aqui na mesa de operações e os meus pais foram descansar um bocadinho, principalmente a minha mãe que não dormiu muito bem. É que o Hospital dos Covões não é pediátrico e ela teve de ficar na mesma cama que eu. Queixa-se de que lhe dei muitos pontapés e que não a deixei dormir, de que acenderam a luz do quarto e que de vez em quando havia barulho!... eu dormi muito bem, não dei por nada.
Até logo! Quando acordar dou notícias, a dizer como está o meu implante, e sobre como me fica o capacete que me prometeram!

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Amanhã vou ser implantado!...

Olá!
Sou o Bininhas, e “a minha vida dava um filme mudo” não fosse um Sr. chamado Michelson ter feito com um sucesso relativo o primeiro Implante Coclear (IC), no ano de 1971 na Califórnia (ver http://en.wikipedia.org/wiki/Cochlear_implant#History).
Por agora será o meu pai a escrever a minha aventura (basta fazerem contas para perceberem que não posso ser eu a dactilografar estas memórias!... deixaria demasiadas pessoas estupefactas!...), mas espero que um dia, possa ser eu próprio a contar-vos como foi a minha vida com um implante coclear, como vivo com isso e como isso afecta ou não a minha vida.
Espero assim poder ajudar outros como eu, pais, familiares e amigos a compreender, conhecer e a seguir o caminho mais adequado relativamente à surdez e aos implantes cocleares.

Nasci em Lisboa, em Outubro de 2008 e encontrei dois papás babados, típico para quem nasce com a responsabilidade de ser o primogénito, que me receberam com grande felicidade numa família cheia de tios, primos, avós e muitos amigos.
Nesses primeiros dias, ainda na maternidade, começou a minha aventura no mundo da surdez. Há que dizê-lo com frontalidade: - no que respeita a conhecimentos sobre a surdez, os meus pais eram uns nabos!... Uma enfermeira aproximou-se deles e perguntou-lhes: - “já fizeram o rastreio auditivo?...” – eles, certíssimos de que esta era apenas mais uma forma de lhes sacar mais dinheiro por parte do Grupo Mello Saúde, disseram de imediato, seguros de que isso era absolutamente dispensável, “não obrigado, fazemos depois!...” ERRADO!!... O rastreio auditivo após o nascimento é muito simples e absolutamente recomendado!...[quote needed] é este rastreio que nos permite identificar problemas auditivos de forma precoce e assim solucioná-los, graças às diversas técnicas e tratamentos existentes actualmente!... Cerca de 3 em cada 1000 bébés nascem com problemas auditivos[quote needed], mesmo com pais sem qualquer problema… e no meu caso, mesmo sem quaisquer antecedentes familiares!!... A não detecção dos problemas auditivos pode afectar e atrasar de forma muito significativa a aprendizagem da linguagem (oral e/ou gestual, conforme as opções de cada um). Não é incomum que casos de surdez, mais ou menos graves, apenas se detectem cerca dos 3 ou 4 anos, quando algumas das hipóteses de tratamento já têm a sua probabilidades de sucesso muito reduzidas, e o desenvolvimento da linguagem pode estar de alguma forma comprometido[quote needed].
Felizmente, dentro do azar que foi nascer surdo (isto pode ser discutível, e não quero aqui dizer que os surdos são menos do que os outros!... mas não há dúvidas de que atravessamos mais dificuldades numa série de aspectos!...+), encontrei uma pequena estrelinha no caminho. Chama-se Dr. Álvaro Birne e é o meu pediatra. Embora não seja comum, o meu pediatra tinha um equipamento, que é pouco maior do que o comando da TV com o qual eu gosto muito de brincar, e que permite fazer um exame simples, chamado Oto-emissões+, e que serve para fazer o tal rastreio de que vos tinha falado… este exame não é infalível, e podia acontecer que o facto de eu não ter passado, não significasse nada… no entanto o meu pediatra disse isso aos meus pais, mas disse-lhes também, após a minha mãe insitir, que nunca tinha tido um falso negativo nos seus exames! Isto, como podem imaginar, foi um choque para os meus pais, que não sabiam muito bem se lhes tinha caído um piano, ou um elefante, em cima… acho que foi um elefante!...
Hoje não tenho mais tempo de vos escrever, porque tenho de ir dormir. Amanhã é um dia importante, mas apenas um de todos os dias que vou ter pela frente neste caminho que os meus pais decidiram para mim, que é o do implante coclear. Amanhã vou ser implantado!
Vou tentar com regularidade continuar a contar-vos como cheguei até aqui, ao Hospital dos Covões em Coimbra, e como está a correr tudo!... Desejem boa sorte para mim (sim, que é a mim que vão fazer maldades!...), para os médicos que me vão operar amanhã e força para os meus pais, que querem acreditar que esta é a melhor opção para mim, para que eu tenha a possibilidade de falar e ouvir o melhor possível, mas que neste momento estão a atravessar um momento difícil, com medo de que alguma coisa corra mal, com medo de ter tomado uma opção que não seja a melhor…