Nove e meia, onze, onze e meia, meio-dia e meia... são assim os meus dias em Coimbra. Na semana depois da activação os meus pais conseguiram estar os dois comigo em Coimbra. Um tirou uns dias de férias, o outro pôs baixa para assistência à família, ou seja, a mim!... e que bela assistência que eles me deram...
No fim-de-semana voltámos a Lisboa. Foi um fim-de-semana muito bom, principalmente porque me vieram visitar a ti'Tunning e o tio Tó Zé Barbas. Brincaram comigo o dia todo até à noite. Ao final da tarde o pai foi buscar a Avó Setinha e jantámos todos juntos.
Depois de jantar fomos todos embora, cada um para seu lado, e eu fui com o papá e a mamã para Coimbra... acho eu, que foi assim, porque no outro dia de manhã, quando acordei, já lá estava.
Durante o fim-de-semana não me importei nada com o aparelho, e o meu pai até o passou para o programa três... faz um bocadinho de cócegas, mas não custa nada.
Agora, todas as segundas-feiras, às nove e meia, vou para o trabalho. É assim que lhe chama a minha terapeuta da fala. Eu não gosto! Bom, na realidade, até não me importo. Fico sentado numa cadeira, à volta de uma mesa cheia de brinquedos junto com as minhas colegas Vanessa e Matilde. Daquilo que não gosto é de ver o meu pai e a minha mãe pelas costas... e farto-me de gritar! Sou assim quando não estou de acordo com alguma coisa. Felizmente passa-me depressa, e fico logo bem disposto. Normalmente começo a brincar com a Matilde e esqueço-me....
Nos Covões há uma sala de espera para os meninos. Quando chegamos de manhã ficamos lá todos na brincadeira. Eu sou o único que ainda não anda sózinho. Por isso gosto muito da brincadeira das cadeiras. Cada um de nós empurra uma cadeira pela sala, daquelas pequeninas, e andamos à volta das mesas a fazer uma barulheira. Depois há sempre alguém que volta a arrumar as cadeiras. A Vanessa gosta de alinhar as cadeiras todas... depois anda em pé por cima delas e salta para as cadeiras dos adultos!
Além deste jogo gosto muito de passear pelas salas de espera, pelos elevadores e principalmente gosto de ficar em pé junto às portas de vidro que dão para a rua.
Ficamos na sala até às onze e meia. Fazemos jogos, brincamos e trabalhamos. O trabalho é muito simples. Agarramos num brinquedo, esperamos que nos digam, por exemplo com o sopro do peixe de borracha, e nós colocamos esse brinquedo numa caixa. O objectivo deste jogo é eu aprender a responder primeiro a este estímulo, para mais tarde passar a responder aos sons. Quando eu souber fazer isto vão poder programar o meu implante de forma a eu poder ouvir o melhor possível. Esta é a razão pela qual vim para Coimbra.
Eu sei que este jogo é muito importante, mas detesto que me segurem as mãos.
No final desta segunda semana já andava com o programa quatro ligado, mas cada vez que ia para a sala choro. Não gosto de estar longe da mamã e do papá, e detesto estar ali preso... a única coisa que me diverte é agarrar nas coisas todas que estão em cima da mesa e atirá-las para o chão... é a única oportunidade que tenho de sair da cadeira e de ir para o chão.
Os meus pais estão com um ar preocupado, e isso não me facilita a vida... quando vou para a sala choro ainda mais e eles ficam ainda com um ar mais preocupado.
Também gosto das onze horas. A essa hora saio de novo da minha sala. Às vezes o meu pai vem-me buscar e eu estou a chorar, porque alguém não me fez a vontade, e outras vezes estou bem disposto a brincar. Até às onze e meia ficamos na sala infantil, de novo todos juntos, a arrastar cadeiras, a comer e a trocar os pneus nas boxes (fraldas no fraldário)... no primeiro dia os meus pais distrairam-se e trocaram-me os pneus na sala de brincar. Que porcaria!...
Das onze e meia até ao meio-dia e meia voltamos aos trabalhos, forçados, e eu continuo, coerente, com a minha atitude... chorona, podemos chamar-lhe.
Esta semana deu cabo dos meus pais, não viram os resultados que na cabeça deles queriam ver, e eu andava assim um bocadinho chorão. Mas a semana acabou melhor, e eu passei a chorar só dez minutos de cada vez que ia para a sala e já não me importava de andar com o programa mais alto.
Só não gosto que me ponham de repente o aparelho na cabeça quando já está ligado... faz-me impressão e eu até estremeço, como se estivesse a levar um choque! Mas não faz mal, é mesmo assim, eu é que não estou habituado. Agora os meus pais começam por me colocar o aparelho desligado na cabeça, e só depois o ligam, e num programa muito baixinho, para eu não me assustar.
Foi assim, a primeira semana depois da activação do implante. Estávamos todos muito cansados e eu fui a dormir no carro o caminho todo até Lisboa. Mas o objectivo desta semana estava cumprido. Já não me incomoda ter o implante na cabeça, já aceito o programa mais alto e lá vou aguentando o tempo que estou na sala.
É isto que se pretende na primeira semana. Não me transformei dum dia para o outro, mas dei um primeiro passo no caminho dos sons. E no fim desta semana, os meus pais até querem acreditar numa série de coisas que "vêem"... eu agora estou sempre a cantarolar, "hmmm, hmm, hmmmmm, hmmm" e às vezes pareço reagir a alguns sons mais altos... eu não sei o que são sons, por isso não os percebo muito bem. Vou esforçar-me para os tentar perceber, mas por favor dêem-me tempo, que esta história dos "sons" é muito confusa, e os bébés demoram normalmente seis ou mais meses até os começarem a entender, um bocadinho... eu já sou um rapaz crescido, mas dêem-me mais uma semana ou duas...
Até logo, já vos conto como foi a segunda semana, em que o meu pai veio com a Avó Setinha e comigo para Coimbra, sobre os patos do jardim, e muito mais...
Olá! Sou o Jonas!
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Eu era apenas um pequeno sonho de infância da minha artista Alice Inácio
(escritora deste blogue) e senti na altura o coração dela a bater acelerado
e o...
Há 8 anos